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terça-feira, 12 de junho de 2007

Fim do Banco

Estava a passar pelo blog do Bruno Nogueira, humorista de se lhe tirar o chapéu, e li o seu ultimo post que, para minha surpresa, foi muito filosófico (não esperava que fosse tão filosófico porque de tudo o que li do "rapaz", é sempre comédia), chamado Fim do Banco. Assim, por ter gostado tanto, pensei: "Vou fazer um post de divulgação do blog e do texto do Bruno Nogueira" e aqui está. Passo agora a mostrar o texto:

Fim do Banco

A idade vai comendo a vida.
Vai ratando o futuro, e nós (eles) a verem.
Acorda-se com um dia a menos, e adormece-se com um dia a mais.
O calendário vai-nos mudando o corpo.
Vai-nos empurrando as costas, para a queda ser pequena.
Os velhos sabem de cor o chão.
Como quem sabe que está quase a chegar lá.
Desde que perdi a minha avó, que ganhei o respeito por quem mora no terceiro andar da idade.
Perde-se para ganhar.
E assim foi.
Emociona-me.
Que vida inteira pode ser sentada sozinha, num banco de jardim?
Com a idade, nunca escolhem o meio, sempre o fim do banco.
Em crianças, teriam-se sentado na outra ponta?
E deixam-se estar.
Respiram como podem.
Os olhos já não procuram nada.
Já viram tudo.
Vão guardando o passado em rugas, para libertar a cabeça.
Em que pensam?
Na morte?
Os velhos não vivem.
Deixam-se viver.
Os filhos já tem a vida deles, não os querem.
Tem de ir viajar e fazer compras para o jantar.
"O pai tem estado bem? Então vá, um beijinho."
Picaram o ponto, e para eles está feito.
Os novos choram com o corpo todo, gritam e fazem caras de quem sofre.
Os velhos choram só com os olhos, que o resto não se vê.
E assim o fazem, no fim do telefonema.
Ninguém os quer com as doenças cheias de idade.
As mãos da idade cheiram a tudo, com as veias cansadas de mostrar o sangue a toda a gente.
As pernas vão perdendo caminho.
Os braços deixam de abraçar.
O coração começa a falhar, já bateu demais mesmo para quem amou pouco.
Vai-se esquecendo de bater.
E uma noite, sem avisar, desaprende.
Desliga os olhos e atira o corpo para o fim.
Ocupam agora o banco todo.
Do principio ao fim, todo ele é corpo.
E os filhos, cansados de telefonar, resmungam.
Morreram oitenta e dois anos, e nem mais um dia.
A cidade não pára, o mundo não interrompe, nada.
Os filhos enterram vinte anos, e guardam os outros sessenta e dois.
Os últimos vinte davam trabalho e de pouco valiam.
Não tem vagar para os guardar.
Mas de hoje em diante, esses vinte vão acordá-los todos os dias.
Até se deitarem sozinhos no banco que os vai deitar.

posted by Bruno Nogueira



Gostaram?
Acho que não punha nem mais um ponto.






Susana

1 comentário:

Anónimo disse...

Grande post e grande texto, sem duvida! :D